No texto da última semana, nós vimos quais fatores são considerados de risco para o aparecimento do câncer de mama. Porém, como pudemos perceber, existem muitas características ambientais e internas que influenciam no desenvolvimento dessa doença e é muito difícil isolar apenas um ou outro fator que contribua unicamente para o câncer. 

No texto de hoje, veremos que existem mutações em genes que podem aumentar consideravelmente a chance de uma pessoa desenvolver um tumor nas mamas, a ponto de escolher retirá-las para que não desenvolva essa doença no futuro. 

BRCA é uma abreviação para BReast CAncer (= câncer de mama). Na espécie humana, existem dois genes BRCA, o BRCA1 e o BRCA2, que ficam em cromossomos diferentes. Cada pessoa possui duas cópias (variantes) de cada um desses genes em seu genoma. O BRCA não causa câncer de mama já que, na verdade, ele é responsável pela produção de proteínas que ajudam na prevenção do câncer, reparando possíveis quebras no DNA e controlando o ciclo celular, fatores esses que podem levar ao surgimento de um tumor nas mamas. Por causa dessa função, BRCA1 e BRCA2 são chamados de genes supressores de tumor. Caso exista alguma mutação nos genes BRCA de maneira que a proteína por eles produzidas não consiga fazer sua função, há uma desregulação no ciclo celular e a multiplicação de células defeituosas, o que pode levar ao surgimento de tumores nas mamas. 

Portadores de mutações nos genes BRCA têm um aumento considerável nas chances de desenvolver câncer de mama, de ovário e de próstata (no caso dos homens) mesmo quando jovens. No caso de mulheres com mutação no gene BRCA1, por exemplo, estima-se que de 55% a 65% desenvolvam câncer de mama até os 70 anos de idade. 

Além disso, a reincidência do câncer é maior em pessoas que têm mutação nos genes BRCA. Estima-se que até 40% das mulheres possam desenvolver um novo tumor nas mamas até 20 anos após o primeiro diagnóstico. O câncer de mama, no caso de pacientes com mutação nos genes BRCA, tende a ser mais agressivo e mais difícil de ser tratado.

As mutações nos genes BRCA1 e BRCA2 podem ser passadas para os descendentes de uma pessoa. Por isso, como forma de entender a presença ou ausência da mutação nesses genes, é possível realizar o sequenciamento dos mesmos. Mas você não precisa ficar preocupado(a) e ir ao médico pedir esse exame. Apenas pessoas com parentes próximos que tiveram câncer de mama, ovário ou próstata e em idade considerada jovem são aconselhados pelos médicos geneticistas a fazerem o sequenciamento dos genes BRCA1 e BRCA2. 

Foi o que aconteceu com a atriz Angelina Jolie. Angelina tem um longo histórico familiar de casos de câncer. A sua mãe, por exemplo, lutou contra o câncer de mama por quase 10 anos e morreu precocemente aos 56 anos. Em seu caso, diante dos fatos e do aconselhamento médico, ela optou por fazer uma cirurgia chamada mastectomia dupla preventiva, que consiste na retirada das duas mamas, seguida de uma reconstrução. De acordo com os médicos da atriz, as chances dela desenvolver câncer de mama caíram de 87% para menos de 5%. A decisão de Angelina, em 2013, incentivou milhares de mulheres a irem conversar com seus médicos sobre a possibilidade de realizarem o sequenciamento genético dos genes BRCA. Esse aumento no interesse pelo sequenciamento e pelo aconselhamento genético foi chamado de “Efeito Angelina” (imagem 1).

Imagem 1: capa da revista Time – o efeito Angelina (The Angelina Effect)

 

Apesar de termos focado nos genes BRCA1 e BRCA2 as empresas que fazem o sequenciamento genético podem testar até 37 genes relacionados ao câncer de mama. O surgimento de novas tecnologias tem feito com que o custo do sequenciamento tenha diminuído consideravelmente. No Brasil, existe um Projeto de Lei (PL 265/2020) que, se for aprovado, fará com que os testes genéticos para os genes BRCA sejam cobertos pelo SUS (Sistema Único de Saúde). Seguindo diretrizes da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), planos privados de saúde já cobrem esse serviço.

Agora que vimos quais fatores ambientais e genéticos podem levar ao surgimento do câncer de mama, na próxima semana vamos entender mais sobre o Outubro Rosa e sobre as formas de prevenir o câncer de mama.

 

Por Nathália de Moraes

nathalia.esalq.bio@gmail.com

 

Referências

[1] https://www.nationalbreastcancer.org/what-is-brca

[2] https://rbc.inca.gov.br/site/arquivos/n_51/v04/pdf/revisao3.pdf

[3] https://www.cancer.gov/about-cancer/causes-prevention/genetics/brca-fact-sheet

[4] https://www.nytimes.com/2013/05/14/opinion/my-medical-choice.html

[5] https://www.mendelics.com/oncologia/

[6] https://www.telegraph.co.uk/news/health/news/11103686/Angelina-Jolies-breast-cancer-announcement-doubled-number-of-women-being-tested-study.html

[7] https://www.plasticsurgery.org/news/blog/inside-the-angelina-jolie-effect-on-breast-reconstruction#:~:text=Angelina%20Jolie%20elected%20to%20proceed,courage%20and%20benevolence%20as%20Ms.

[8] https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2236990 

[9] http://www.ans.gov.br/a-ans/sala-de-noticias-ans/consumidor/2316-ans-amplia-cobertura-obrigatoria-para-29-doencas-geneticas-#:~:text=Os%20procedimentos%20descritos%20na%20Nota,de%20mama%20e%20ov%C3%A1rio%20heredit%C3%A1rios

[10] Fonte da imagem 1: https://www.theipinionsjournal.com/2016/10/breast-cancer-awareness-month-beware-the-angelina-effect/

[11] Fonte da imagem em destaque: geneticliteracyproject.org/2019/07/30/why-did-i-get-cancer-we-can-do-more-to-alleviate-angst-guilt-accompanying-a-diagnosis/

 

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