Hoje comemoramos o dia de um dos animais mais incríveis desse planeta, a serpente! Tudo bem, todos os seres vivos são de alguma forma interessantes, mas me acompanhe nessa conversa.
O que chamamos de serpentes são animais que apareceram na Terra há aproximadamente 100 a 125 milhões de anos2. Todo esse tempo em que estão aqui permitiu que uma série de novidades surgissem em seus variados grupos. A perda de membros locomotores (isso mesmo, sem pernas e sem braços!), o grande número de vértebras (+ de 120, enquanto nós seres humanos temos apenas 33) e a alta mobilidade do crânio (mexer ossos de forma independente!) são exemplos concretos disso. Por esses motivos, vemos nelas um corpo longilíneo e ágil, bem como a capacidade de comer alimentos maiores que a própria cabeça. Isso sem contar na variedade de cores e formas, desde muito pequenas e que vivem escondidas no solo (Fig. 1), até animais grandes e corpulentos (Fig. 2).
São quase 4 mil espécies de serpentes espalhadas em praticamente todo o globo, ocupando os mais variados ambientes, como mares, rios, pântanos, desertos, florestas e outros. Por isso, podemos apreciar exímias nadadoras, como a cobra marinha (Laticauda colubrina) de vida oceânica que fica até quase duas horas sem respirar; e camuflagens impecáveis, como a víbora-de-chifres (Crotalus cerastes) que habita desertos e se esconde na areia. Pensando em regiões tropicais, como aqui na América do Sul, a diversidade de serpentes é tamanha que muitas espécies ainda não foram descritas ou encontradas, ou seja, muitas novidades ainda podem aparecer!
As características mais importantes para identificação das espécies e gêneros de serpentes incluem a contagem e a forma das escamas, incluindo as escamas do ventre, do dorso e da cabeça. A organização dos ossos do crânio e o formato do órgão reprodutor masculino (hemipênis) também são utilizados na taxonomia. Do ponto de vista ecológico, as serpentes tanto auxiliam no controle de populações, atuando como predadoras, como servindo de presa para outros animais. A existência de serpentes em ambientes naturais impede o aparecimento de superpopulações, como de roedores, e garante a permanência de outras espécies, como o acauã (Herpetotheres cachinnans), ave de rapina que se alimenta majoritariamente de serpentes. A presença de serpentes em ambientes urbanos ou periurbanos não é um prejuízo ou um problema de saúde pública, pelo contrário, isso significa que ali ainda possui alguma característica que nos denote natureza.
Podemos viver harmoniosamente com as serpentes, desde que tenhamos respeito por outras formas de vida, optando por dividir o planeta de forma honesta. Consequentemente, que possamos aproveitar a oportunidade de apreciar a beleza desses animais exuberantes. Feliz dia para elas, que depois de tanta história, agora tentam existir em um planeta com cada vez menos natureza.
Por: Nathalie Citeli
Agradeço a Mariana de-Carvalho e Patricia Sujii pelos comentários na primeira versão do texto.
Nathalie Citeli é bióloga e aluna de doutorado na Universidade de Brasília, sua pesquisa é voltada para validação e identificação de novas espécies amazônicas de cobras d’água (gênero Helicops).
Referências
1 – Luiselli, L., Sale, L., Akani, G. C., & Amori, G. (2020). Venomous snake abundance within snake species’ assemblages Worldwide. Diversity, 12(2), 69.
2- Hsiang, A. Y., Field, D. J., Webster, T. H., Behlke, A. D., Davis, M. B., Racicot, R. A., & Gauthier, J. A. (2015). The origin of snakes: revealing the ecology, behavior, and evolutionary history of early snakes using genomics, phenomics, and the fossil record. BMC evolutionary biology, 15(1), 1– 22.