Há muitos estudos sendo realizados para conhecer rotas migratórias, determinar como alterações climáticas podem afetar diferentes espécies de pássaros e reintroduzir pássaros com risco de extinção de volta à natureza. Nesse artigo eu vou falar um pouco a respeito dessas pesquisas que têm como maior objetivo a conservação de espécies migratórias. Se você quiser saber mais sobre como e porque os pássaros migram, você pode dar uma olhada no meu texto anterior. Boa leitura!

 

A migração e as alterações climáticas

Alterações no clima podem ter ajudado na evolução da migração das aves, mas isso aconteceu de forma relativamente lenta. Com a queima de combustíveis fósseis as alterações climáticas estão ocorrendo de forma mais rápida do que os pássaros conseguem acompanhar. Em vários países da Europa, por exemplo, as temperaturas estão ficando mais quentes mais cedo a cada ano, fazendo com que plantas floresçam e insetos surjam mais cedo.

 

Como os pássaros normalmente buscam locais com clima mais quente, eles acabam migrando para o seu local de reprodução mais cedo, correndo o risco de haver falta de sincronia entre a reprodução e a disponibilidade de alimentos. Um exemplo dessa dessincronia é a ave chamada de papa-moscas-preto (Ficedula hypoleuca) (Figura 1) que há poucos anos respondeu às mudanças climáticas se reproduzindo mais cedo, mas não o suficiente, pois infelizmente os insetos essenciais para a sua alimentação e de sua prole levaram menos tempo ainda para surgir, fazendo com que o pico de número de insetos acontecesse bem antes da época que as aves precisavam alimentar seus filhotes.

 

Figura 1. Papa-moscas-preto (Ficedula hypoleuca).

 

Na migração, os pássaros devem chegar no seu local de destino tarde o suficiente para que o clima esteja mais favorável e com disponibilidade de alimentos, porém, cedo o suficiente para que haja espaço para se reproduzirem e fazerem seus ninhos. O exemplo citado acima mostra um desequilíbrio entre a quantidade de pássaros, insetos e brotos das árvores, o que pode afetar todo o ecossistema e assim resultar na diminuição das populações de pássaros migratórios, no aumento da quantidade de insetos e consequentemente na diminuição do número de folhas de árvores e plantas.

 

Estudando pássaros migratórios

Diante de tantas adversidades que os pássaros enfrentam durante a migração, diferentes estudos são realizados para determinar a rota migratória e promover a proteção e conservação de espécies.

 

Um exemplo de estudo comumente realizado é a determinação de locais em que os pássaros descansam e se alimentam durante o trajeto de viagem, a partir de rastreamento por satélite. Dessa forma, é possível conhecer e promover a conservação desses lugares tão importantes para o sucesso da migração dos pássaros.

 

Um estudo recente mostrou que até 2070, provavelmente 80% dos pássaros migratórios terão que aumentar o tempo e a distância das rotas de migração para chegar aos locais de reprodução por causa das mudanças climáticas. Nesse estudo, a rota de diferentes espécies foi determinada e a morfologia da asa e massa corporal foram utilizadas para estimar a distância que pássaros seriam capazes de voar sem precisar pousar para se reabastecerem. Esses dados foram combinados com projeções de rotas alteradas por mudanças climáticas para predizer futuras rotas migratórias e o tempo total de migração. A consequência do aumento da distância de migração predito é o potencial risco para o declínio da população pássaros.

 

A reintrodução das espécies de aves migratórias

Na última década, estudos utilizando ultraleves com o intuito de reintroduzir espécies migratórias para seu habitat natural têm sido realizados. Uma espécie de ibis chamada Liethe (Geronticus eremita) (Figura 2) apresenta elevado risco de extinção na natureza. Há séculos atrás, essa espécie era encontrada na África, Ásia e partes da Europa. Os antigos egípcios reverenciavam essa ave que tinha símbolo de divindade, como pode ser observada em hieróglifos datados de milhares de anos atrás. Séculos atrás, essa ave era comumente observada perto de humanos e se reproduzia perto de cidades e castelos. Por diferentes motivos, mas principalmente pelas guerras que ocorreram na Europa, essas aves passaram a diminuir em quantidade e a migrar para outros continentes.

 

Figura 2. Liethe (Geronticus eremita)

 

Hoje em dia, há apenas uma pequena população encontrada no Marrocos, Turquia e Leste da África. A população que está presente em zoológicos pelo mundo, é maior que a população total dessa espécie presente na natureza. A partir do desenvolvimento de vários projetos com o objetivo de reintroduzir diferentes espécies de ibis de volta à Europa está sendo possível observar Liethe nos alpes europeus novamente.

 

Um desses projetos, desenvolvido por pesquisadores na Áustria, tem o objetivo de estabelecer uma nova rota de migração para os pássaros criados em cativeiro para que os mesmos voltem para seus habitats de origem. A ideia desse projeto começou quando pássaros Liethe trazidos para um zoológico na Áustria desapareceram durante a noite. Depois de um tempo descobriu-se que eles haviam migrado para a direção contrária do que deveriam ir e, infelizmente, morreram. Os pesquisadores resolveram então guiá-los a partir do uso de um ultraleve para a seu destino final, na Europa central. Pela primeira vez, em 2004, os pássaros seguiram o ultraleve e uma nova rota de migração foi estabelecida. Depois da primeira migração, os pássaros começaram a se reproduzir na natureza e ensinaram sua prole a realizar a mesma rota migratória que seus “pais” humanos os ensinaram (Figura 3).

 

Figura 3. Cientistas voando de ultraleve para guiar pássaros migratórios.

 

É estimado que aproximadamente 40% das espécies de pássaros sejam migratórias. Dessa forma, o estudo da migração das aves é fundamental para garantir a conservação de diferentes espécies. Os estudos apresentados acima são apenas alguns exemplos das pesquisas que estão sendo realizadas atualmente. Esperamos que no futuro mais projetos como esses sejam desenvolvidos para contribuir com a conservação de espécies e consequentemente com o equilíbrio de diferentes ecossistemas.

Por Bianca Ribeiro

biancaribeiro0589@gmail.com

 

Referências

 

[1] Predicting Life-Cycle Adaptation of Migratory Birds to Global Climate Change. Acessado de http://www.bioone.org/doi/pdf/10.5253/arde.v90i3.p369 em Outubro de 2018.

[2] Figura 1

[3] How will climate change affect bird migration? Our scientists explain. Acessado de https://www.birdlife.org/worldwide/news/how-will-climate-change-affect-bird-migration-our-scientists-explain em Outubro de 2018.

[4] Figura 2

[5] Figura 3: After a 400-Year Absence, A Rare Ibis Returns to European Skies. Acessado de https://e360.yale.edu/features/after-a-400-year-absence-waldrapp-rare-ibis-returns-to-european-skies em Outubro de 2018.

[6] Imagem em destaque: Bianca Ribeiro.

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