Desde o início da pandemia do novo coronavírus, sair de casa exige novos rituais que envolvem uma série de preocupações, desconforto com máscara, um suprimento absurdo de álcool em gel, higienizar compras e assim por diante. Mas antes da covid-19, você provavelmente não ficava preocupado se pegaria sarampo, rubéola, difteria e outras doenças só porque alguém tossiu ao seu lado. Devemos agradecer aos cientistas e profissionais de saúde que desenvolvem e têm aplicado vacinas para nos proteger de todas essas doenças e muitas outras. Já deixo aqui meu muito obrigada a todos eles!

Na década de 1980, a cada ano, eram registrados aproximadamente 100 mil casos de sarampo, 80 mil de coqueluche, 10 mil de pólio e de difteria no Brasil. Hoje, quase nem ouvimos falar dessas doenças. Não vivemos mais esse cenário graças ao Programa Nacional de Imunizações que teve início em 1975 e promove a vacinação gratuita em todo o território do país. O Brasil, graças a esse programa e ao SUS (Sistema Único de Saúde), é um dos países que mais distribui vacinas gratuitamente à população. Isso contribuiu para evitar a morte precoce de centenas de bebês e crianças e para aumentar a expectativa de vida do brasileiro de 57 para 76 anos. [1,2]

Em 2016, tínhamos erradicado o sarampo no Brasil, mas em 2018 vimos um surto ser assunto em todos os jornais. O sarampo é causado por um vírus que se espalha por gotículas respiratórias produzidas ao tossir ou espirrar. Ele causa febre alta, erupção cutânea (veja imagem abaixo), cansaço, falta de apetite e sintomas respiratórios, principalmente tosse. Sua letalidade varia de 5% a 10% dependendo do nível de desenvolvimento do país, caso não sejam adotadas medidas preventivas, como vacinação e monitoramento de casos. Estudos realizados por pesquisadores do Ministério da Saúde e da Universidade de Brasília mostraram como isso aconteceu. [3,4]

Criança com erupções na pele, características do 4o dia de evolução da doença. Fonte: CDC/NIP/ Barbara Rice

Os pesquisadores mostraram que, entre 2007 e 2014, todas as regiões do Brasil alcançaram e até ultrapassaram a meta de 95% de cobertura vacinal de sarampo em crianças de 1 ano de idade. Porém, a partir de 2015, essa cobertura começou a sofrer redução e chegou a 85% em 2017. O surto de 2018 teve maior incidência em estados da região norte, por onde o vírus provavelmente entrou no país. Nessa região, a cobertura vacinal tem estado abaixo de 90% desde 2015. [3] 

Outro fato preocupante sobre a vacinação no Brasil é a heterogeneidade da cobertura vacinal. Em todas as regiões, existem municípios em que praticamente todas as crianças foram devidamente vacinadas contra o sarampo, mas em média, apenas metade dos municípios alcançaram essa meta. As desigualdades socioeconômicas entre municípios e entre bairros de cada município contribuem para a heterogeneidade da cobertura vacinal. Por outro lado, o estudo também mostrou que o Programa de Saúde da Família (que foca no atendimento primário às famílias para prevenção e acompanhamento de doenças) e o número de salas de vacinação contribuem para uma melhor cobertura vacinal nos municípios. [4]

Em algumas regiões, essa diminuição da cobertura vacinal tem sido causada pela dificuldade de acesso da população às vacinas. Isso ocorre em regiões mais remotas e com menos recursos para saúde. Porém, também temos visto uma menor taxa de vacinação entre pessoas de grandes centros urbanos, com maior poder aquisitivo, mesmo em países ricos. Por que pessoas mais ricas e instruídas têm optado por não se vacinar? 

No texto da semana que vem, vamos discutir o que as pesquisas dizem sobre isso. Mas até lá, conta pra mim, você já pensou em não se vacinar? Por que? Tem algum medo ou dúvida? Comenta aqui embaixo, manda um e-mail ou uma mensagem nas nossas redes sociais. Ao longo deste mês, vou responder às perguntas que vocês me enviarem para que possamos nos proteger dessas doenças de forma consciente e informada. 

Você sabia que temos vacinas para tomar ao longo de toda vida? Confira o calendário vacinal aqui: https://antigo.saude.gov.br/saude-de-a-z/vacinacao/calendario-vacinacao

por Patricia S. Sujii

cienciainformativa@gmail.com

Referências

[1] Domingues, C. M. A. S., Maranhão, A. G. K., Teixeira, A. M., Fantinato, F. F., & Domingues, R. A. (2020). The Brazilian National Immunization Program: 46 years of achievements and challenges. Cadernos de Saúde Pública, 36, e00222919.

[2] http://pni.datasus.gov.br/apresentacao.asp

[3] https://saude.rs.gov.br/sarampo

[4] https://portal.fiocruz.br/noticia/o-sarampo

[5] Pacheco, F. C., França, G. V., Elidio, G. A., Domingues, C. M. A. S., de Oliveira, C., & Guilhem, D. B. (2019). Trends and spatial distribution of MMR vaccine coverage in Brazil during 2007–2017. Vaccine, 37(20), 2651-2655.

[6] Pacheco, F. C., França, G. V., Elidio, G. A., Leal, M. B., de Oliveira, C., & Guilhem, D. B. (2020). Measles-containing vaccines in Brazil: Coverage, homogeneity of coverage and associations with contextual factors at municipal level. Vaccine, 38(8), 1881-1887.

Imagem de capa: Freepik

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