Na semana passada vimos que animais e plantas respondem às mudanças de temperatura e luz solar, por exemplo, com a alteração em seus ritmos de crescimento, na reprodução, na busca por alimento (no caso de animais), no florescimento (no caso de plantas), etc.
Essas respostas são estratégias naturais, moldadas por milhões de anos de evolução, e que agora enfrentam mudanças por causa da intensificação do aquecimento global e de todas suas consequências (que não se resumem apenas ao aumento da temperatura média do planeta).
No caso dos animais que hibernam, ou seja, que reduzem drasticamente seu metabolismo no período de inverno para diminuir o gasto energético, já existem inúmeros estudos que demonstram a alteração no ritmo natural de hibernação de algumas espécies em face às mudanças climáticas globais. Vamos a alguns exemplos?
Para saber mais: a hibernação é uma forma pela qual diversas espécies de animais - morcegos, ursos, esquilos, borboletas - passam para enfrentar os dias frios de inverno, reduzindo drasticamente seu metabolismo para salvar energia e não necessitar buscar alimento ou migrar para outros lugares.
O urso-negro (figura 1), típico urso norte-americano, é uma espécie cujo hábito de hibernação está intimamente ligado à temperatura e, por consequência, à distribuição de alimento. Durante 5 anos, cientistas conseguiram monitorar e analisar os hábitos de hibernação (como início, duração e término do período) de 51 fêmeas de urso-negro através de colares com dispositivos GPS em uma área próxima a Durango, no Colorado (EUA). Eles conseguiram estabelecer quais fatores foram mais determinantes para o hábito de hibernação nessa espécie. A principal e mais importante conclusão do estudo publicado em 2018 é que temperaturas mais altas influenciam ao atrasar o início da hibernação e também ao diminuir o período pelo qual o animal hiberna, podendo trazer prejuízos, inclusive, a sua reprodução, colocando em risco a espécie.
Outro exemplo preocupante é o caso do esquilo do norte de Idaho (Urocitellus brunneus). Ameaçados de extinção, os esquilos da espécie hibernam por até 8 meses no ano e, segundo cientistas da Universidade de Idaho (EUA), podem acabar sendo prejudicados pelas alterações climáticas que ocasionam diminuição do período de neve e aumento nos níveis de chuva, resultando na redução do tempo de hibernação e expondo mais os esquilos aos seus predadores, já que eles deixariam a toca/abrigo mais cedo. Além disso, ao sair da toca antes do previsto, eles reduzem as chances de encontrar fontes abundantes de alimento aos quais estão acostumados.
Cabe lembrar que essas alterações climáticas modificam também o crescimento de plantas que, muitas vezes, servem de alimento e abrigo a esses animais que hibernam. Um exemplo é o caso dos morcegos que podem hibernar se empoleirando (abrigando) em algumas árvores, que de acordo com previsões, poderão ficar mais escassas por conta das mudanças ambientais.
É muito importante reforçar que mudanças no hábito de hibernação provavelmente vão alterar a fisiologia dos animais de uma maneira na qual as espécies podem não conseguir se adaptar a tempo. Assim, sem uma estratégia de manejo e proteção, as ações humanas podem ameaçar a existência de várias espécies de animais e a interação destas com outras espécies e, inclusive, com a nossa.
Por Nathália de Moraes
nathalia.esalq.bio@gmailcom
Referências
[1] https://www.discoverwildlife.com/animal-facts/what-is-hibernation/
[2] https://besjournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1111/1365-2664.13021
[3] https://mashable.com/article/animals-that-hibernate
[4] https://www.pnas.org/content/117/30/18119.short
[5] https://academic.oup.com/jmammal/article/102/2/574/6224539?login=true
Fonte da figura 1: https://mammals.carnegiemnh.org/pa-mammals/black-bear-ursus-americanus/
Fonte da imagem em destaque: https://bear.org/do-black-bears-hibernate/