Há algumas semanas nós aprendemos que, quando estamos comendo, o preço que nós pagamos pela comida pode influenciar quão saciados nós vamos nos sentir. Esta semana, nós vamos descobrir outro fator surpreendente que afeta o nosso nível de saciedade: a memória!
A saciedade de que estamos falando aqui envolve não apenas comida, mas todo tipo de experiência. Ela é simplesmente a queda gradual do quanto nós estamos apreciando da atividade que estamos realizando e da nossa vontade de continuar nela. Isso se aplica, por exemplo, a comer, a ouvir música e a jogar jogos – basicamente, qualquer atividade que aconteça de forma continuada.
A velocidade com que nós ficamos saciados varia de pessoa para pessoa, dependendo de vários fatores. Por exemplo, indivíduos distraídos pela televisão enquanto almoçam se saciam mais devagar e acabavam comendo mais. Um outro fator importante para o sentimento de saciedade é a memória: pessoas idosas, que possuem uma capacidade de memória reduzida, demoram mais para se saciar do que pessoas mais jovens.
Dois cientistas americanos estudaram a relação entre a memória e a saciedade de uma forma interessante. Eles focaram em um tipo específico de memória: a memória de trabalho. A memória de trabalho agrupa um conjunto de componentes que guia a atenção, processa estímulos e integra e armazena a informação por um curto tempo para nós nos lembrarmos dela. Assim, uma capacidade maior de memória de trabalho pode corresponder, por exemplo, à habilidade de manter simultaneamente na sua mente vários estímulos e de processá-los e recuperá-los mais rápida ou facilmente.
Para entender a relação entre a memória de trabalho e a saciedade, esses pesquisadores realizaram quatro estudos. Nesses estudos eles mediram a capacidade de memória de trabalho dos participantes usando alguns testes eficientes (por exemplo, o jogo Genius, onde o jogador deve lembrar de uma sequência de cores que vai aumentando a cada rodada). Além disso, eles apresentaram estímulos distintos a vários grupos de participantes: pinturas, músicas populares e músicas clássicas pouco conhecidas. Enquanto eles apresentavam os estímulos, os cientistas perguntavam coisas aos participantes como quanto eles estavam gostando daqueles estímulos e quanto eles queriam continuar vendo/ouvindo-os (medindo, assim, a progressão do sentimento de saciedade).
No estudo 1, os pesquisadores descobriram que pessoas com uma maior capacidade de memória de trabalho se saciavam mais rapidamente do que as com uma capacidade menor. No estudo 2, ao pedir para os participantes estimarem o número de vezes que eles tinham ouvido cada música, eles observaram que a relação entre a memória de trabalho e a saciedade era mediada pela percepção de consumo. Isto é, quando a capacidade dos indivíduos era maior, eles achavam que tinham ouvido as músicas mais vezes e se sentiam saciados mais rapidamente.
No estudo 3, depois de apresentarem os estímulos aos participantes, os cientistas pediram que eles fizessem um teste para reconhecer quais músicas eles tinham ou não ouvido durante a apresentação. Quando eles reconheciam melhor as músicas, isso significava que eles faziam um processamento e codificação dos estímulos mais profundamente. Nesses casos, eles também se sentiam saciados mais rapidamente. Por fim, no estudo 4, os pesquisadores instruíram explicitamente alguns participantes a “processar profundamente” os estímulos apresentados e não deram nenhuma instrução explícita aos outros. Novamente, os indivíduos que haviam processado as pinturas mais profundamente (prestando mais atenção nelas, por exemplo), sentiram-se saciados mais rapidamente do que os outros.
Então, basicamente, o que esses cientistas descobriram foi que, quanto maior a sua capacidade de memória de trabalho, mais rapidamente você se sacia. Isso acontece, pois as pessoas com essa maior capacidade têm a sensação de ter “consumido” o estímulo mais vezes. Além disso, elas também processam esse estímulo mais profundamente – mas, mesmo que elas não tenham a capacidade tão grande, se elas forem instruídas a processar o estímulo profundamente, elas também se saciam mais rapidamente.
Esses achados têm inúmeras implicações em várias áreas do comércio e até mesmo da nossa vida pessoal!
E você: quão boa será a sua memória?
Thomaz Offrede
Referência
Nelson, N. M., & Redden, J. P. (2017). Remembering Satiation: The Role of Working Memory in Satiation. Journal of Consumer Research, pp. 1-18.