Um estudo ecotoxicológico divulgado no início deste ano revelou um resultado alarmante: populações de ribeirinhos, que vivem próximas às usinas hidrelétricas na Amazônia, estão expostas à contaminação por mercúrio. Cerca de metade da população investigada está contaminada com mercúrio, o que pode indicar possíveis problemas de saúde pública. No texto de hoje, vamos entender qual o problema dessa contaminação e o que é possível fazer para diminuir os riscos para a saúde das pessoas que vivem ali.

O mercúrio é um metal líquido à temperatura ambiente, insolúvel em água e muito usado em áreas de garimpo de ouro, pois misturado à água dos rios facilita ao garimpeiro encontrar o metal precioso. É um metal muito perigoso para a saúde humana; alguns sintomas relacionados à contaminação por mercúrio são: diarréia, tremores, confusão mental, alterações no sistema imune, aumento da pressão arterial, entre outros. Além desses problemas, em mulheres em idade fértil, o mercúrio pode causar danos ao desenvolvimento do feto, principalmente no sistema nervoso.

Um grupo de pesquisadores – que inclui brasileiros e espanhóis – analisou amostras de fios de cabelo de 37 ribeirinhos que moram próximos à Usina de Tucuruí, na bacia do Rio Tocantins (imagem 1). Mais de 50% dos ribeirinhos apresentaram índice de contaminação por mercúrio sete vezes maior que o considerado seguro pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A contaminação, segundo o artigo, está na forma de metilmercúrio, que é a mais tóxica, pois é capaz de atingir o sistema nervoso, visto que consegue enganar as defesas do corpo.

Imagem 1: usina Tucuruí, no Rio Tocantins. Fonte: [4]

Os resultados encontrados nesta pesquisa são até maiores que os vistos em populações que vivem expostas à contaminação proveniente de minas de ouro, o que sempre foi – infelizmente – algo muito comum na Amazônia. Segundo a pesquisa, essa contaminação é consequência da construção da usina hidrelétrica de Tucuruí aliada ao fato de que o solo da Amazônia é naturalmente rico em mercúrio, devido à sua origem pedológica.

Isso acontece por conta da construção das barragens que represam a água, em determinadas áreas, por mais de 2 meses. Quando a água rica em matéria orgânica do rio sofre a ação da luz solar, há formação do peróxido de hidrogênio – H2O2 (popularmente conhecido como água oxigenada); esse H2O2 libera o mercúrio inorgânico que estava estocado no solo amazônico agora inundado. Esse mercúrio inorgânico é transformado em metilmercúrio, sua forma mais tóxica, por bactérias presentes na água.

Esse fato, gera uma grande preocupação. O metilmercúrio pode facilmente ser absorvido por algas, que servirão de alimento para peixes, que poderão ser consumidos pelas populações humanas que, por fim, ficam contaminadas com o metal pesado. Essa passagem e gradual acúmulo do metal pesado nos níveis tróficos das cadeias alimentares é chamada de bioacumulação e biomagnificação. Sabe-se, de estudos anteriores, que peixes tucunarés da região do estudo estão contaminados por metilmercúrio tanto quanto as populações de peixes que estão em área de garimpo, onde o uso de mercúrio é intenso.

É importante lembrar que, apesar de o estudo ter detectado altos níveis de mercúrio, nenhum dos ribeirinhos apresentava qualquer sintoma da contaminação, pois pode demorar anos até que os sintomas comecem a aparecer, o que torna a contaminação por mercúrio, silenciosa.

Além dos estudos ecológicos, é importante aumentar a fiscalização de empresas e órgãos responsáveis por usinas e barragens; além disso, é preciso investir em mais estudos para conhecer os riscos e as consequências ambientais e sociais da construção de usinas hidrelétricas. Também é preciso aumentar o monitoramento da saúde dessas populações afetadas, afinal o maior perigo é o fato de essa contaminação ser silenciosa.

E você, conhecia mais esse risco associado à construção de usinas hidrelétricas?

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Até a próxima!

Por Nathália de Moraes

nathalia.esalq.bio@gmail.com

Referências

[1] Andrade, R. O. (2018). Contaminação além do garimpo. Revista Pesquisa FAPESP. Acessado de http://revistapesquisa.fapesp.br/2018/03/08/contaminacao-alem-do-garimpo/?cat=ciencia em março de 2018.

[2] Arrifano, G. P. F. et al. (2018). Large-scale projects in the amazon and human exposure to mercury: The case-study of the Tucuruí. Dam. Ecotoxicology and Environmental Safety. 147: 299-305. Acessado de https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0147651317305444 em março de 2018.

[3] Mercúrio (elemento químico). Wikipédia. Acessado de https://pt.wikipedia.org/wiki/Merc%C3%BArio_(elemento_qu%C3%ADmico) em março de 2018.

[4] Museu Virtual Tucuruí. (sem data). Usina Hidrelétrica de Tucuruí. Acessado de http://www.museuvirtualtucurui.com.br/hidreletrica/ em março de 2018.

[5] Imagem em destaque: https://www.greenme.com.br/viver/saude-e-bem-estar/566-mercurio-as-principais-fontes-e-os-10-motivos-que-explicam-a-sua-toxidade-para-o-nosso-organismo

 

 

2 Replies to “O perigo silencioso da contaminação por mercúrio na Amazônia”

  1. Gostaria de registrar um fato que talvez tenha alguma relação com esta matéria, pois envolve o peróxido de hidrogênio e a liberação de mercúrio. No dia 11/08/18 fiz um tratamento dentário em que foi usado o peróxido de hidrogênio. Sete horas após tive um excesso de salivação e sensação de pele muito seca nas maos e nos pés , me causando uma irritação que me levou a sentir arrepios. Pesquisei sobre o tratamento dentário e descobri um estudo que diz que o peróxido de hidrogênio pode levar à liberação de mercúrio das obturacoes dentárias feitas com amalgamas. Estas informações me levaram a concluir que não devo dar continuidade ao tratamento dentário, pois acho que posso ter, mesmo que de forma minima, me contaminado com este metal pesado chamado mercúrio. Vou iniciar um tratamento de desintoxicação para evitar problemas de saúde pois ontem dia 12/08/18 também senti mãos e pés muito secos e arrepios. Obrigada.

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