Parte II: a doença e as medidas de controle
“A OMS tem tratado da disseminação [do COVID-19] em uma escala de tempo muito curta, e estamos muito preocupados com os níveis alarmantes de contaminação e, também, de falta de ação [dos governos]”. Essas foram as palavras ditas por Tedros Adhanom, diretor geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), em 11 de março de 2020 quando a OMS declarou a COVID-19 como pandemia. Entender o que a doença causa e como é a progressão dos sintomas no corpo humano são informações importantes para se diagnosticar e controlar a pandemia. Não se pode controlar uma doença que não se conhece.
Como o SARS-CoV-2 age no corpo humano?
A doença causada pelo SARS-CoV-2 afeta as pessoas de diferentes maneiras. Nos primeiros relatos, os principais sintomas observados pelos médicos eram os tipicamente vistos em uma pneumonia viral, principalmente tosse e falta de ar. Por algum tempo foram esses os sintomas pelos quais os profissionais de saúde se guiavam para saber se uma pessoa estaria ou não com COVID-19. Hoje, graças aos inúmeros estudos, sabemos que a doença causada pelo novo coronavírus também pode provocar diarreia, conjuntivite, dor de cabeça, perda de paladar e de olfato; todos esses sintomas podem demorar até cerca de 14 dias para aparecer. Algumas pessoas são chamadas assintomáticas e podem nem saber que estão doentes, embora possam transmitir o vírus segundo disse Maria van Kerkhove, líder técnica do programa de emergências da OMS.
No início da pandemia as pessoas idosas representavam a maior parte dos casos sérios e que, eventualmente, levavam à óbito. Essas pertenciam ao chamado grupo de risco. Com novos estudos sabemos que não apenas os mais velhos desenvolvem os sintomas mais sérios: pessoas que têm doenças pulmonares, cardíacas, diabetes ou que são pacientes em tratamento de câncer também fazem parte do grupo de risco.
A variedade de sintomas da COVID-19 pode ser explicada tendo em vista como o SARS-CoV-2 age no corpo humano. Segundo os pesquisadores, o vírus pode ser considerado sistêmico e não apenas um vírus que ataca os pulmões, o que antes era pensado. Uma vez no sistema circulatório, ele consegue atacar os sistemas digestório, urinário e nervoso. Alguns relatos indicam que arritmias podem estar associadas a presença de SARS-CoV-2 no corpo humano, além também de casos de encefalite (inflamação no cérebro) e falência renal.
A febre, um sintoma muito comum em gripes, resfriados e outras enfermidades, é também um sintoma de COVID-19, porém diferentemente do que ocorreu na MERS (Síndrome Respiratória do Oriente Médio) e na SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave), a febre aparece com menos frequência em pacientes com COVID-19. Segundos os estudos mais recentes, o quadro febril é muito mais comum nos adultos do que nas crianças, que geralmente são assintomáticas. O que sabemos até agora é que possivelmente antes mesmo da febre surgir a pessoa já pode transmitir o vírus por meio de gotículas de saliva espalhadas por tosse, espirros e pela fala. É nesse fato que está o grande perigo do SARS-CoV-2: o seu fácil espalhamento pelo ar e pelo contato com superfícies contaminadas por gotículas de saliva.
A transmissão da doença
O entendimento de como o novo coronavírus se espalha e da progressão dos seus sintomas no corpo humano foram fundamentais para as autoridades de saúde moldarem as formas de diagnóstico e prevenção da doença. Sabemos que a principal forma de transmissão é pelas gotículas de saliva que carregam o vírus. Lugares fechados e com ar condicionado são ambientes ideais para a transmissão da doença. Na Coreia do Sul, por exemplo, foram reportados casos de COVID-19 logo após a reabertura de bares na capital Seul.
Quando as gotículas com coronavírus caem em corrimões, maçanetas, mesas e até nas embalagens de alimentos, essas superfícies também se tornam meios de propagação da doença. Estudos mostram a detecção do material genético do coronavírus até nas fezes de pessoas infectadas, porém até o momento não se sabe se a transmissão fecal poderia ser considerada uma forma de infecção.
Cientistas que estudam mecânica dos fluídos avaliam também outros fatores que, segundo eles, são importantes para entender a transmissão do SARS-CoV-2: o tamanho das gotículas e a velocidade na qual são expelidas. Quando uma pessoa espirra ela pode espalhar milhares de gotículas no ar, que rapidamente caem e contaminam superfícies; já quando uma pessoa fala ela libera cerca de 50 gotículas, que podem ficar “flutuando” por um bom tempo no ar. Essas gotículas que pairam no ar podem ser aspiradas por alguém que pode se contaminar com o SARS-CoV-2. Para os pesquisadores, falta ainda entender bem por quanto tempo o vírus fica viável nas superfícies e no ar.
Quando a pandemia surgiu, as autoridades de saúde indicavam como medidas de prevenção o distanciamento social, com o fechamento de escolas, shopping centers, academias, restaurantes e outros locais de aglomeração. A máscara era indicada apenas para os indivíduos com sintomas e para os profissionais médicos. Pouco tempo depois, a OMS passou a recomendar o uso de máscaras por todas as pessoas e, no início de junho, recomendou o uso de máscaras com pelo menos 3 camadas filtrantes e, no caso de pessoas doentes, máscaras médicas do tipo N95.
Além do distanciamento social, mais rígido ou mais flexível dependendo da localidade, outras estratégias foram tomadas para diminuir o espalhamento da doença. Na Nova Zelândia, país que recentemente declarou não ter mais casos de COVID-19, foi implementado o que ficou popularmente chamado “bolha de quarentena” ou “bolhas sociais”. Nessas situações, as pessoas podem escolher alguns amigos/parentes (no máximo 10) com as quais manterão contato social. Essa bolha é exclusiva, uma pessoa pode participar apenas de 1 desses círculos sociais. Se uma dessas pessoas se infectar, todas as outras da mesma bolha entram em quarentena. Apesar de limitada, a “bolha social” é uma forma de permitir contato e já está sendo cogitada de ser implementada também em outros países, como Inglaterra, Escócia, Bélgica e Alemanha.
Além de permitir moldar as estratégias de prevenção, entender o curso e como a doença se espalha permite elaborar melhor os testes diagnósticos e possíveis formas de tratamento para a COVID-19. Na próxima semana veremos mais sobre os tratamentos e a procura por uma vacina que nos proteja da COVID-19.
Por Nathália de Moraes
Referências
[1] https://www.unasus.gov.br/noticia/organizacao-mundial-de-saude-declara-pandemia-de-coronavirus
[2] http://weekly.chinacdc.cn/en/article/id/e3c63ca9-dedb-4fb6-9c1c-d057adb77b57
[5] https://www.cdc.gov/coronavirus/2019-ncov/symptoms-testing/symptoms.html
[7] https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0753332220303875
[9] https://www.consumerreports.org/medical-symptoms/fever-and-covid-19-what-to-know/
[11] https://www.nature.com/articles/s41562-020-0898-6
[14] https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7074995/
[15] https://phys.org/news/2020-05-fluid-dynamics-covid-spreadand.html
[16] Imagem em destaque: CDC dos EUA
[17] Fonte da figura do texto: https://www.freepik.com/free-vector/social-distancing-concept_7464585.htm