No meu último texto vimos que a comunicação é um fenômeno muito importante e amplo que compreende desde a comunicação humana (como o nosso blog de divulgação científica) até a comunicação entre as células do nosso corpo e a sinalização entre as bactérias. Mas como ocorre este fenômeno no reino animal? No texto de hoje vamos entender melhor como a comunicação animal é, na verdade, muito mais complexa do que pensamos; e digo isso por experiência própria: a disciplina de Comportamento Animal foi uma das mais ricas que cursei durante minha graduação, que abriu meus olhos para entender como o comportamento – e dentro deste, a comunicação – evoluíram nos animais.

Um dos exemplos mais interessantes na minha opinião é o que ocorre com alguns corvos e a história de como o pesquisador Bernd Heirich descobriu o fato é igualmente fascinante. Heirich sabia que estava diante de um enigma quando observou, durante um inverno, que corvos que se alimentavam de uma carcaça gritavam, atraindo outros corvos para a fonte de alimento. Mas por que os pássaros simplesmente não ficavam em silêncio para garantir o alimento farto, sem ter que dividir com os outros que apareciam? Uma das primeiras hipóteses que Heirich pensou foi que os corvos gritavam para chamar os “parentes” da mesma família que estavam na vizinhança para se alimentarem da carcaça. No entanto, essa hipótese foi rejeitada quando análises de DNA fingerprint  (veja mais sobre essa técnica no box abaixo) mostraram que os corvos que visitavam a carcaça não pertenciam a uma mesma família. Então, após várias observações do que acontecia, Heirich descobriu que, na verdade, os corvos só chamavam aos outros quando eles chegavam em uma carcaça que estava em um território guardado por um casal dessa mesma espécie de pássaro. Os casais defendem agressivamente uma carcaça que esteja em seu território, assim quando corvos que não tem par avistam uma fonte de alimento eles gritam para que outros corvos, também sem par, cheguem e assim vençam juntos as defesas do casal residente, podendo então se alimentar.  Essa comunicação oral é o que os pesquisadores denominam “chamada de recrutamento”. Fantástico, não é mesmo?

http://www.publicdomainpictures.net/view-image.php?image=25540&picture=corvo
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DNA fingerprint. Nosso DNA possui sequências específicas de A, T, C e G que são reconhecidas e cortadas por algumas enzimas. Quando “cortamos” o DNA com essas enzimas são produzidos pequenos fragmentos do DNA de vários tamanhos e que podem ser visualizados em um gel. Nesse gel, o DNA aparece como bandas dispostas do maior para o menor tamanho, como se fosse então uma “impressão digital” do DNA no gel (por isso o nome fingerprint). Como cada pessoa tem sequências únicas de A, T, C e G no seu DNA as enzimas “cortam” também de maneira diferente o DNA de cada indivíduo e, por consequência, o fingerprint será diferente de pessoa para pessoa, ou no caso do texto, de animal para animal. Pessoas da mesma família possuem DNA fingerprint semelhante e dessa forma que é possível fazer os testes de paternidade. Quer saber mais? Veja esse vídeo no Youtube: DNA Fingerprinting Technique

Outro caso bem interessante é o do suricato, que vive na África – você provavelmente deve conhecê-lo como o Timão do filme “O Rei Leão”.  Este pequeno mamífero tem uma maneira bem própria de avisar aos seus companheiros da chegada de um predador. Eles se revezam em turnos e sempre alguns dos indivíduos do grupo tem a função de “sentinela”, ou seja, ficam observando se existem predadores por perto. Se eles avistam algum predador em potencial, emitem sinais específicos como um grito, que alertará aos outros animais do grupo do perigo iminente. Algumas pesquisas indicam, inclusive, que o grito emitido é tão específico que informa aos suricatos do grupo qual é o predador e o quão perigosa é a situação.

Com esses exemplos podemos ver como a vocalização é importante para a comunicação entre os animais. Mas será que outros tipos de comunicação, como a visual, também são importantes?

A resposta é sim. Além dos sinais de corte das aves, que são importantes para a escolha dos parceiros, a dança das abelhas é um dos exemplos mais interessantes de comunicação visual que existem no reino animal. Os pesquisadores observaram que quando uma operária volta de um lugar que tem alimento disponível ela dança na colméia, repetidamente, para avisar suas companheiras onde está o alimento. O ângulo e a duração dos movimentos do abdômen da abelha indicam a distância e a direção para onde as outras operárias devem ir para buscar pólen e néctar. Isso mostra como esses insetos cooperam para viverem socialmente.

Somente com esses exemplos já podemos ver o quanto a comunicação nas suas diversas formas é importante para os animais, pois ela tem papel no comportamento e, por consequência, na sobrevivência dos mesmos. A comunicação pode ajudar a encontrar alimento, parceiros e a se esconder de predadores. Nós, humanos, também somos animais e, a primeira vista, pode nos parecer que a comunicação em nossa sociedade é restrita apenas ao que a tecnologia nos proporciona. Mas o que será que nos possibilitou a comunicação falada, por exemplo? Como ela foi importante para nossa sobrevivência na pré-história? Será que nossos “parentes” neandertais também falavam como nós falamos?

Ficou curioso? No próximo texto vamos entender como a comunicação surgiu nos humanos e de que forma ela foi importante para nossa sobrevivência! Quer saber mais sobre o assunto de hoje? Abaixo estão alguns links com mais informações e vídeos interessantes sobre o tema. Sugestões e perguntas são sempre bem vindas!

 

Até a próxima!

Por: Nathália de Moraes

nathalia.esalq.bio@gmail.com

 

[1] Townsend, S.W., Rasmussen, M., Clutton-Brock, T., Manser, M.B. (2012). Flexible alarm calling in meerkats: therole of the social environment and predation urgency. Behavioral Ecology, doi: 10.1093/beheco/ars129. Acessado em 20 nov. 2014.

[2] Alcock, J. (2001). Animal Behavior: an evolutionary approach. 7º Ed. Sunderland:MA, Sinauer Associates. 494 p.

[3] Tarpy, D.R. (sem data). The honey bee dance language. Acessado do site da North Carolina State University (NCSU), Departamento de Entomologia.

[4] At-Bristol Science Centre. (2014). Why do honey bees dance? (vídeo no Youtube). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=2S-ozxpIrdI

[5] Globo Natureza. (2013). Suricatos (vídeo na internet). Disponível em:http://globotv.globo.com/rede-globo/globo-natureza/v/globo-natureza-suricatos/2616884/

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