Como vimos no meu último texto os animais podem não ser capazes de formar palavras na linguagem oral como conhecemos, mas é fato que eles se comunicam, como vimos no caso da vocalização dos corvos e com a dança das abelhas. A comunicação portanto é importante para os animais com um papel determinante no comportamento e na sobrevivência deles.
Apesar de muitas pessoas pensarem que a comunicação em nossa sociedade humana é restrita ao que a tecnologia nos proporciona (e hoje vemos isso com o crescimento do uso de emails, mensagens, SMS e videochamadas), esse fenômeno na verdade é muito mais complexo e amplo em vários aspectos. Nós humanos nos comunicamos por sinais, por olhares, pela postura do corpo, por ferormônios, pela música e pela dança e muito importante: pela linguagem oral, ou seja, pela habilidade de colocar em palavras faladas os nossos pensamentos. A linguagem oral é indiscutivelmente uma das características mais importantes que nos possibilita estender a nossa racionalidade aos outros indivíduos e isso traz muitas vantagens para nós, que vivemos em sociedade.
Mas será que nossos parentes próximos, os neandertais, também falavam? Como a linguagem pode ter surgido nos humanos modernos? Que vantagens ela nos traz? No texto de hoje vamos responder essas e outras questões bem interessantes!
Os neandertais (Homo neanderthalensis) sempre nos fascinaram e apesar de um pouco negligenciados após terem sido descobertos, pois muitas pesquisas propunham que eles eram nada mais do que humanos débeis, hoje se sabe que eles teriam a capacidade, ao menos anatômica, de falar também.
As primeiras pesquisas feitas (por volta da década de 70) indicavam que faltava aos neandertais algumas partes anatômicas importantes para que a fala como conhecemos pudesse ser produzida; fonemas muito usados no nosso repertório (como [u], [i] e [a]) seriam impossíveis de serem produzidos pelos neandertais, semelhante ao que ocorre com um bebê humano, que não fala quando nasce, pois não possui todas as habilidades necessárias desenvolvidas. Porém, tais evidências podem ser contestadas pois são feitas com base em comparações anatômicas de esqueletos que muitas vezes não estavam bem preservados, o que coloca em dúvida esses resultados.
Já na década de 80, com a descoberta de novos esqueletos, foi visto que muitos ossos importantes para a habilidade da fala (por exemplo, o osso hióide que pode ser visto nessa imagem) estavam presentes e posicionados de forma semelhante nos neandertais e nos humanos modernos, o que pode indicar que (anatomicamente falando) não existiam limitações que os impedisse de falar. Os estudos mais recentes sobre o modo de vida dos neandertais mostram que eles teriam uma forma de comunicação um pouco mais desenvolvida que os “grunhidos” vocalizados por alguns hominídeos mais ancestrais (como o Homo heidelbergensis), mas não uma linguagem oral complexa como a nossa. Hoje em dia, pesquisas focam ainda em entender se os neandertais teriam o controle neural suficiente para ter a mesma habilidade vocal que nós temos ou se as vocalizações que eles produziam poderiam ser somente uma imitação de que eles ouviam dos humanos modernos, com os quais conviveram por um período de tempo.
Até hoje os cientistas não têm um consenso sobre se/qual linguagem os neandertais tinham; com os estudos arqueológicos e até com base em análises mais modernas do DNA se propõe que várias mutações foram se acumulando gradativamente ao longo da evolução dos hominídeos, possibilitaram o desenvolvimento da fala e se fixaram pelo grande avanço adaptativo que nos proporcionaram.
Tanto a habilidade da fala quanto os outros aspectos culturais (não tão desenvolvidos nos outros hominídeos (veja no box abaixo) que surgiram antes da nossa espécie) são únicos e foram muito importantes para a nossa habilidade de comunicação e isso nos possibilitou ter sucesso e vantagem para sobreviver.
Box: Hominídeos Homo sapiens, Homo neanderthalensis, hominídeos…muitos nomes complexos, não é? A evolução humana é bem interessante e com certeza renderia um texto somente sobre esse assunto, mas nesse site do Museu de História Natural Smithsonian você pode conferir uma árvore que mostra todos nossos “parentes” e com explicações de cada espécie. Ficou curioso? Acesse:http://humanorigins.si.edu/evidence/human-family-tree |
As habilidades cognitivas – e portanto também de comunicação – foram essenciais para que os humanos modernos sobrevivessem ao processo de seleção natural, se espalhassem pelo mundo e ocupassem os mais diversos ambientes. Para os cientistas, a habilidade de se comunicar com os outros indivíduos pelas pinturas (como a que vemos na figura) possibilitou ao homem pré-histórico se comunicar sobre fontes de alimentos e predadores, fazendo com que os homens pudessem viver em sociedade, pois, dessa forma, os acontecimentos eram comunicados aos outros indivíduos do grupo.
Exemplo de pintura rupestre encontrada no Brasil. Fonte da imagem: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Pinturas_Rupestres_-_Vale_do_Catimbau_-_Pernambuco_-_Brasil.jpg |
A fala também nos proporcionou a mesma vantagem, de comunicar os acontecimentos, perigos e presas, de forma eficiente. Assim, a comunicação nas suas diversas formas foi muito importante para que nós sobrevivêssemos ao mundo e às mais diversas adversidades.
A tecnologia, tal como emails e mensagens de celular, é na verdade uma extensão da comunicação que sempre fizemos, que nos proporciona viver como uma “aldeia global”, de forma com que possamos nos comunicar com qualquer pessoa em praticamente todo lugar do mundo. De fato, a tecnologia modificou toda nossa forma de comunicação, mas como vimos, o fenômeno (no seu sentido mais estrito) já existia desde nossos ancestrais. Mas como será que a tecnologia nos proporcionou isso? Será que ela só nos traz vantagens? O que podemos esperar da tecnologia e da comunicação no futuro? Ficou interessando em saber? No próximo texto vamos entender essas questões!
Ficou curioso com o assunto do texto de hoje? Nos links abaixo tem mais informação e curiosidades sobre esse vasto campo do conhecimento humano!
Dúvidas e sugestões são bem-vindas! Até a próxima!
Nathália de Moraes
Fale com a pesquisadora: nathalia.esalq.bio@gmail.com
Referências bibliográficas
[1] Australian Museum. (sem data). Homo sapiens: modern humans. Acessado de http://australianmuseum.net.au/Homo-sapiens-modern-humans/ em dezembro de 2014.
[2] Discovery News. (2012). Humans vs Neanderthals: how did we win? Acessado de http://news.discovery.com/human/evolution/humans-vs-neanderthals.htm em dezembro de 2014.
[3]Demeliou. (2013). Did Homo neanderthalensis speak? Acessado de https://demeliou.wordpress.com/2013/02/03/did-homo-neanderthalensis-speak/ em dezembro de 2014.
[4] Milo, R.G. & Quiatt, D. (1993). Gluttogenesis and anatomically modern Homo sapiens. Current Anthropology, 34 (5): 569-598. Disponível em: http://www.jstor.org/stable/2744275
[5] Sherwod, C.C.; Subiaul, F.; Zawidzki, T.W. (2008). A natural history of the human mind: tracing evolutionary changes in brain and cognition. Journal of Anatomy, 212 (4): 426-454. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2409100/pdf/joa0212-0426.pdf
[6] Lieberman, P. & Crelin, E.S. (1971). On the speech of neanderthal man. Linguistic Inquiry, 11(2): 202-222. Disponível em: http://www.haskins.yale.edu/Reprints/HL0104.pdf
[7] Max-Planck-Gesellschaft. (2013). Did Neandertals have language? Disponível em: http://www.mpg.de/7448453/Neandertals-languag
[8] Bryant, C.W. (sem data). How did language evolve? Disponível em: http://science.howstuffworks.com/life/evolution/language-evolve.htm
Com a evolução hoje olhando ao passado somos gratos ao ideologistas e aos grandes transformadores pois sinceramente não sei se a geração de hoje saberia viver como nossos antepassados e essas primeiras gerações.