Vamos conversar um pouco sobre a influência das guerras na produção científica? No mundo globalizado, a informação viaja quilômetros em instantes de segundos, chegando a toda a parte do mundo praticamente em tempo real. As notícias de conflitos em muitos países não são diferentes. Assistimos à Guerra do Iraque em 2003, ao Conflito Civil na Síria em 2011 e, mais recentemente à Guerra Civil no Leste da Ucrânia. Vamos pensar na produção científica por traz desses conflitos, qual o real impacto das guerras na ciência?
É fato que muitas tecnologias utilizadas hoje no nosso dia a dia foram desenvolvidas em grandes guerras, como o forno micro-ondas, o GPS, câmeras fotográficas, entre outros. O filme “O jogo de imitação” lançado em 2014 nós mostra um pouco de como foi criado o primeiro protótipo de computador na Segunda Guerra Mundial pelos ingleses, objeto fundamental para a derrota alemã no conflito. Porém, hoje eu quero trazer “um outro lado” da história, o lado das perdas na produção científica causadas pela guerra.
No conflito atual ocorrido na Ucrânia, iniciado com a decisão do governo de não assinar o acordo com a União Europeia em 2013, dividiu a população em dois grupos: um a favor da incorporação da Ucrânia a Rússia, e outro separatista, que não aceitam essa união. Os conflitos entre esses grupos acarretaram em problemas sérios sobre os setores acadêmicos e científicos na Ucrânia afetando mais de 1.500 cientistas e mais de 100.000 estudantes.
As últimas notícias mostram que o governo já deslocou mais de 11 universidades que se localizam nas áreas de conflito temendo ataque às instituições. Nesse deslocamento muita coisa ficou para trás. São laboratórios, amostras, espécimes e trabalho de uma vida todo que ficaram perdidos em meio a guerra. No sudeste da Ucrânia encontra-se um dos maiores polos de universidades, institutos e centros de pesquisa, com a presença da Universidade Nacional de Donetsk, umas das melhores universidades do país. Com deslocamento e evacuação desses polos é esperada uma queda acentuada na produção e desenvolvimento da ciência.
Um dos piores casos foi o ataque a Academia Nacional de Ciências da Ucrânia, que devido à resistência de muitos pesquisadores de realizar o deslocamento da área, o instituto teve que ser abandonado às pressas, deixando tudo o que havia nele para trás. E mais recentemente o governo ucraniano perdeu o controle do Observatório de Astrofísica da Criméia, considerado um dos bens mais preciosos para a ciência nacional e que desenvolvia estudos importantes em geodinâmica, como a detecção de irregularidades na rotação da Terra.
No meio do problema alguns pesquisadores tentam desesperadamente “contrabandear” amostra e dados das suas antigas universidades. O que sobrou das pesquisas do cientista Zagorodnyuk foi seu hd externo com alguns dados e publicações, que ele conseguiu salvar passando com o objeto preso com fita crepe em suas pernas por vários locais onde os separatistas controlam.
Mas essas perdas não se restringem apenas a Ucrânia. Os extremistas pertencentes ao grupo Estado Islâmico, que vem aterrorizando o mundo com seu caráter violento e desumano, destruíram o sítio arqueológico da cidade iraquiana Hatra, considerado Patrimônio Nacional da UNESCO. O grupo atacou a história de um país e seu povo ao destruir ruinas do século XIII a.C., uma das mais importantes heranças arqueológicas do país.
Até onde irão os crimes de guerra contra a população, a sua história e sua ciência? Não é possível saber. Não existe um consenso sobre o que virá daqui para frente. Assim quem mais sai perdendo é a população desses locais, que deixam tudo construído na vida para trás, em busca das mínimas condições de sobrevivência. E como sua população, a ciência sofre.
Por Nathalia Brancalleão na_brancalleao@hotmail.com
Referências Bibliográficas:
Science, “Exodus from the East”, Richard Stone, Kyiv and Vinnytsya, Ukraine.
Harvard Summer School, “The Conflict in Ukraine: a Historical Perspective”, Lauren McLaughlin
Global Research, “Ukrainians Against War. Conscripts Refuse to Fight against Their Own Citizens”, Stephen Lendman 29/01/2015