Julho é mês de férias e muitas pessoas aproveitam esse período para viajar e descansar. Se você utilizar as estradas para este propósito certamente irá se deparar com uma cena bem triste: animais atropelados às margens das estradas. Mas será que esses casos podem ser considerados esporádicos? Será que a forma como as rodovias são projetadas interfere na ocorrência dessas mortes? Como nós podemos ajudar a diminuir esses casos? No texto de hoje vamos entender quão grave é essa questão e como podemos colaborar para reverter esse quadro.

Desde a política do “governar é abrir estradas” proposta pelo então governador de São Paulo Washington Luís o Brasil tem hoje aproximadamente 203.943,3 km de estradas pavimentadas (http://oglobo.globo.com/brasil/no-brasil-80-das-estradas-nao-contam-com-pavimentacao-13710994). Apesar de serem importantes para o desenvolvimento da sociedade e de suas atividades, as estradas são fonte de interferência humana nos ecossistemas. Elas são a causa de ruídos, poluição atmosférica, podem fragmentar ecossistemas, alterar habitat, servir como barreiras aos animais e aumentar a taxa de atropelamentos.
      Mas de que forma a construção de estradas aumenta o número de animais atropelados? O primeiro motivo é que as rodovias “cortam” o habitat natural dos animais, interferindo em seus deslocamentos naturais, ou seja, as estradas acabam passando pelos caminhos e locais que os animais visitavam e andavam. O segundo motivo é que próximo às estradas existe maior disponibilidade de alimentos (como grãos e frutas) derrubados por caminhões e isso leva a um ciclo de problemas: imagine que um animal vá para perto de uma estrada, pois sente o cheiro de comida, infelizmente esse animal acaba sendo atropelado e sua carcaça fica na estrada; depois de um tempo, outro animal começa a se deslocar para a perto desse local, pois sente o cheiro da carcaça, podendo ser atropelado também e assim sucessivamente.
       Funcionando como barreiras, as estradas “assustam” e desencorajam os animais a se deslocarem de um lado para outro, deixando de seguir seus padrões e instintos naturais. Se um animal não consegue chegar em um lugar específico ou morre atropelado no percurso, os danos podem ser grandes. Ele pode não conseguir encontrar recursos como alimentos, ficar longe de seu grupo e, em uma escala mais problemática, não encontrar um parceiro para reprodução o que pode levar à diminuição de indivíduos de uma espécie e menor variabilidade genética. Em casos extremos podem ocorrer extinções regionais de algumas espécies. Além disso, as estradas acabam diminuindo a qualidade de um habitat natural por causa da poluição causada pelas fumaças tóxicas e pelos ruídos. É fácil perceber que não é legal morar perto de uma estrada, pois até mesmos nós humanos nos incomodamos com esses problemas.
      Existem muitos estudos e levantamentos que ajudam a entender melhor esse problema ambiental. Uma estimativa feita nos EUA revela que as chances de uma tartaruga sobreviver ao tentar atravessar uma estrada é de 2%, ou seja, praticamente nula. No Brasil as estatísticas são assustadoras: estima-se que por DIA 1,3 MILHÕES de animais morram atropelados, o que resulta em 475 MILHÕES de animais selvagens atropelados no Brasil por ANO. Noventa por cento desse total é de pequenos vertebrados, ou seja, anfíbios (sapos e pererecas) e répteis (serpentes e pequenas tartarugas); 9% são vertebrados de médio porte, como as corujas, e 1% são vertebrados de grande porte, como as onças. Os animais de menor porte são atingidos com maior frequência, pois são mais difíceis de serem vistos e desviados. O atropelamento de animais também é perigoso para nós humanos, pois essas situações podem ocasionar acidentes graves de veículos.
      Diante de todos esses dados alarmantes devemos nos perguntar: o que podemos fazer? Para a nossa sorte existem pessoas muito empenhadas em resolver o problema de atropelamento da fauna silvestre. Alguns estudos mostram quais ações podem ser feitas para diminuir os atropelamentos, entre essas está a construção de desvios, corredores ecológicos, cercas e passagens. Essas “construções” garantem que os animais fiquem protegidos e consigam se deslocar com segurança de um lugar para outro quando em seu habitat natural existem estradas (veja na figura 1 alguns exemplos).

Figura 1- Exemplos de construções que ajudam na proteção e deslocamento dos animais silvestres na beira de estradas

E nós podemos fazer a nossa parte também! Além de prestar atenção às placas de sinalização das estradas (como na figura 2) podemos ajudar na coleta de dados sobre os atropelamentos e para isso a tecnologia é a nossa aliada! Criado no Brasil o Sistema Urubu é a maior rede social com o objetivo de estudar e ajudar na preservação da fauna brasileira; ele reúne informações de várias fontes para auxiliar na tomada de decisão para preservar a nossa biodiversidade. E sabe o que é o melhor de tudo? Você pode ser um colaborador! Basta baixar o aplicativo gratuito Urubu Mobile e a partir daí você já é um guardião da nossa natureza; sempre que encontrar um animal atropelado basta fotografar e enviar ao banco de dados; a partir desse momento os especialistas vão validar e estudar a foto, identificando, por exemplo, a espécie do animal que foi atropelado; essa informação é então depositada em um banco de dados ao qual todos têm acesso e que é atualizado diariamente. Você pode ter mais informações e acessar esses dados públicos clicando aqui: http://cbee.ufla.br/portal/sistema_urubu/index.php

Figura 2 – Placa em beira de estrada sinalizando a presença de animais silvestres. Fonte da imagem: http://www.rodosol.com.br/blog/wp-content/uploads/2011/01/placa-fauna1.jpg

Mas além de tudo isso as pessoas precisam ter consciência ambiental. Saber que todos os outros animais merecem respeito e merecem cuidados também. Uma pesquisa feita no Canadá utilizou serpentes e tartarugas falsas (feitas de borracha) para simular uma situação de um animal presente nas margens de uma pista. As respostas observadas pelos pesquisadores podiam ser (A) motorista ajudou no resgate do animal, (B) o motorista desviou do animal (C) o motorista atropelou o animal; o resultado observado demonstrou que alguns motoristas intencionalmente atropelavam os animais. Triste não é mesmo? Com isso podemos perceber que antes de mudar estradas, construir cercas ou criar aplicativos, precisamos mudar nossa forma de pensar e isso depende de cada um de nós.

Diante disso, nós temos que ser conscientes, cobrar atitudes dos políticos, colaborar com as iniciativas dos pesquisadores como do Sistema Urubu e sobretudo, sermos humanos! A conservação das nossas riquezas depende de nós!

E você já viu algum animal atropelado na pista? Qual foi sua reação? E o que acha de propostas como a do Sistema Urubu? Ficou com alguma dúvida ou tem alguma sugestão? Fique à vontade e comente em nossa página!

 

Até a próxima,

 

Por Nathália de Moraes

nathalia.esalq.bio@gmail.com

 

Referências bibliográficas

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[2] Lima, S.F.; Obara, A.T. (sem data). Levantamento de animais silvestres atropelados na BR-277 às margens do Parque Nacional do Iguaçu: subsídios ao programa disciplinar de proteção à fauna. Acessado de http://pt.slideshare.net/PaulaBugana/animais-atropelados-emrodovias em maio de 2015.

[3] Sássi, C.M.; Nascimento, A.A.T.; Miranda, R.F.P.; Carvalho, G.D. (2013). Levantamento de animais silvestres atropelados em trecho da rodovia BR482. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia. 65 (6). Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-09352013000600041

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[5]Gaskill, M. (2013). Rise in roadkill requires new solutions. Acessado dehttp://www.scientificamerican.com/article/roadkill-endangers-endangered-wildlife/ em maio de 2015.

[6] Atropelômetro do Sistema Urubu. Acessado de http://cbee.ufla.br/portal/atropelometro/ em maio de 2015.

[7]_______. Acessado de http://cbee.ufla.br/portal/sistema_urubu/urubu-info.php em maio de 2015.

[8] Ashley, E.P.; Kosloski, A.; Petrie, S.A. (2007). Incidence of intentional vehicle-reptile collisions. Human Dimensions of Wildlife. 12: 137-143. Disponível em: http://longpointwaterfowl.org/wp-content/uploads/2011/08/Ashley-et-al.-roadkill.pdf

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