Foi durante uma das minhas iniciações científicas que eu, trabalhando com um fungo que causa doença na cana-de-açúcar, descobri um jeito inusitado e tecnológico de acompanhar a colonização de um micro-organismo na planta: fazer ele brilhar.

Sim, porque os micro-organismos estão em TODA a parte. Seja no solo, nas plantas ou em você (e em mim, também!), esses pequenos seres são capazes de habitar os mais distintos lugares e formar diferentes relações com seus hospedeiros. E ao contrário do que se pensa, a maioria das relações estabelecidas entre micro-organismos e plantas ou animais é neutra ou benéfica!

Mas no meu caso, eu estudei o fungo chamado Sporisorium scitamineum (esse é o nome científico dele, em latim, usado para que, qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo, possa saber de que organismo o cientista está falando – já pensou se cada um usasse o nome na sua própria língua?). Ele é responsável pelo aparecimento de uma doença chamada Carvão na cana-de-açúcar. E a cana-de-açúcar, como é de se imaginar, é uma das culturas mais importantes para o país, já que é a partir dela que é feito o etanol combustível.

E o que eu fiz durante minha iniciação científica foi justamente tentar entender como esse fungo coloniza, ou seja, vive na cana-de-açúcar. Mas imagine: o fungo é um ser muito pequeno, microscópico, e aí está um grande desafio em tentar entender por onde ele anda dentro da planta. É por isso que os cientistas – e aqui eu também me incluo – utilizam de algumas técnicas para monitorar esses seres tão pequenos. A minha saída foi: tornar esse fungo brilhante!

Vou explicar: existe uma proteína chamada Proteína Verde-Fluorescente que, como o próprio nome diz, emite uma cor verde-fluorescente quando exposta à luz ultravioleta. Bom, naturalmente o fungo S. scitamineum não tem o gene (parte do material genético) capaz de formar essa proteína. Então, o que eu fiz no laboratório, foi inserir esse gene dentro do material genético do fungo.

GFP

Figura adaptada de Carvalho et al. 2016

Na célula: Vemos o processo de inclusão do gene da proteína verde-florescente no material genético do fungo S. scitamineum. Após a entrada do gene na célula, enzimas são responsáveis por cortar e inserir o gene da proteína verde-fluorescente no material genético do fungo.

No microscópio: Inicialmente, a célula do fungo não possuía nenhuma fluorescência, depois da inclusão do gene da proteína verde florescente, as células ficaram fluorescentes, como é possível ver nas imagens acima.

Para chegar à célula do fungo S. scitamineum capaz de emitir fluorescência, foram necessários muitos passos e processos que precisaram ser otimizados. Meu trabalho consistiu em ajustar processos, otimizar protocolos, repetir muitas vezes um mesmo experimento para acertar o trabalho. Por fim, o fungo fluorescente foi utilizado para melhor compreender como ele infectava a planta e, também, para conhecer o próprio ciclo de vida do fungo causador do carvão.

Em realidade, essa é uma abordagem muito utilizada na biologia para o estudo de fungos e bactérias em diferentes ambientes. É impressionante como uma característica tão curiosa – a fluorescência – vem sendo utilizada como ferramenta científica. E você, já conhecia essa técnica?

Maria Letícia Bonatelli

Esse é um texto semifictício, baseado na história de Jaqueline Almeida,durante sua iniciação científica em que trabalhou com o fungo causador do carvão em cana-de-açúcar. Para saber mais da pesquisa, acesse o artigo publicado aqui ou pegue a referência abaixo.

Referência:

Carvalho, G., Quecine, M. C., Longatto, D. P., Peters, L. P., Almeida, J. R., Shyton, T. G., … & Monteiro‐Vitorello, C. B. (2016). Sporisorium scitamineum colonisation of sugarcane genotypes susceptible and resistant to smut revealed by GFP‐tagged strains. Annals of applied biology, 169(3), 329-341.

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