Você já deve ter ouvido que o Cerrado possui somente capim e árvores tortas, certo? Geralmente menosprezado, estamos aqui hoje para desmistificar esse conceito e mostrar as belezas que este lindo bioma tem a oferecer.

O bioma Cerrado possui uma biodiversidade bastante rica e é o segundo maior bioma brasileiro, apenas superado pela Floresta Amazônica. Localiza-se basicamente no Planalto Central do Brasil abrangendo três estados do Brasil Central (Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul) e o Distrito Federal. Além disso, sua área incide sobre os estados de Tocantins, Minas Gerais, Bahia, Maranhão, Piauí, Rondônia, Paraná e São Paulo. Com isso, ocupa cerca de 22% do território nacional, área equivalente a 2 milhões de km² (Bastos & Ferreira, 2010). 

O termo “Cerrado” é comumente utilizado para representar um conjunto de fitofisionomias (aspectos da vegetação de uma determinada região) enquadrados em três tipos de formações: florestais (Mata Ciliar, Mata de Galeria, Mata Seca e Cerradão); savânicas (Cerrado sentido restrito, Parque de Cerrado, Palmeiral e Vereda); e campestres (Campo Sujo, Campo Limpo e Campo Rupestre) (Figura 1) (Ribeiro & Walter, 1998). 

Figura 1. Principais fitofisionomias do bioma Cerrado. Estas 11 fitofisionomias estão apresentadas num gradiente daquelas de maior biomassa (Formações Florestais à esquerda) para as de menor biomassa (Formações Savânicas e Campestres à direita), na posição topográfica em que geralmente ocorrem. Esse esquema não implica que cada uma dessas fitofisionomias ocorra na natureza uma ao lado da outra, nessa topossequência. (Modificado de Bastos & Ferreira, 2010).

O Cerrado tem como característica marcante a ocorrência de duas estações bem definidas: período chuvoso que ocorre de outubro a abril; e período seco que ocorre de maio a setembro. 

É considerado um dos hotspots mundiais para a conservação de biodiversidade. Este termo é utilizado para designar regiões com grande riqueza natural, mas que, no entanto, passam por um frequente processo de degradação e desmatamento. A ocupação humana tem afetado diretamente a biodiversidade da região de forma que 20% das espécies nativas estão ameaçadas de extinção. Expansão da fronteira agrícola brasileira, produção de carne e grãos para exportação, fragmentação de habitat, erosão do solo, exploração predatória de material lenhoso para produção de carvão são algumas das razões pelas quais o Cerrado vem sofrendo. Apesar disso, este bioma é considerado a mais rica savana do mundo, possuindo mais de 11 mil espécies de flora nativas, com elevado nível de endemismo. Isto significa que diversas espécies de plantas são encontradas somente nesta região (Klink & Machado, 2005). 

Além da abundante flora, há uma notável diversidade de habitats e fitofisionomias que geram a oportunidade de abrigar diversos grupos de fauna. São encontradas aproximadamente 837 espécies de avifauna, 1200 espécies de peixes, 180 de répteis, 150 de anfíbios e 199 de mamíferos (Marinho-Filho et al., 2002). 

Figura 2. Lobo-guará (Chrysocyon brachyurus) no Parque Nacional da Serra da Canastra. Fonte: Ferrarezi Jr. / Flickr

 

O bioma muitas vezes é considerado o berço das águas do Brasil já que suas nascentes alimentam oito das doze regiões hidrográficas do Brasil, onde três bacias são de grande importância e resultam em elevado potencial aquífero, são elas: rio São Francisco; rio da Prata no Estado do Paraná; e rios Araguaia/Tocantins. 

O solo do Cerrado é considerado um solo distrófico, ou seja, um solo de baixa fertilidade, já que apresenta alto teor de alumínio, pH entre 4,3 a 6,2 e baixa disponibilidade de nutrientes como ferro, cálcio, potássio, zinco e magnésio. Isso faz com que o solo seja ácido e tóxico para algumas espécies de plantas o que acaba por influenciar na morfologia das mesmas, tornando-as menores e com cascas mais grossas. Para as árvores não adaptadas a esta condição, isso pode dificultar o seu crescimento. A variação entre as estações seca e chuvosa também pode influenciar na formação da camada de alumínio no solo. Este fenômeno chama-se laterização do solo onde há formação de uma crosta laterítica. Segundo Haridasan (1982), a variedade de fitofisionomias presentes no bioma Cerrado é resultado da toxicidade, baixa fertilidade e acidez do latossolo. No entanto, para a agricultura isso não se consistiu em obstáculo, ocupando extensas áreas de terra para a cultura de soja e afins. Aproximadamente 45% do Cerrado já foi convertido em lavouras diversificadas e pastagens cultivadas. Além disso, a dispersão de espécies exóticas introduzidas erroneamente no bioma tem se tornado um problema para as espécies nativas já que competem pelos recursos naturais e implicam ameaças à biodiversidade local (Walter, 2006).  

A criação de unidades de preservação é de grande importância para a proteção da biodiversidade e conservação da rica e variada flora e fauna da região. Para exemplificar, podemos mencionar algumas áreas de proteção distribuídas pelo Cerrado, como: Parque Nacional da Chapada dos Guimarães; Parque Nacional da Serra da Canastra; Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros (Figura 3); e Parque Nacional de Brasília. 

Figura 3: Vista panorâmica da Chapada dos Veadeiros. Fonte: Adelano Lázaro.

 

Então, você que pensa que o Cerrado só tem árvore torta e mato seco, saiba que há um infinito ecossistema de plantas e animais que enriquecem e representam esse bioma tão rico e lindo. 

Por Samara de Albuquerque Teixeira

Bióloga CRBio/04 – 098306

 

Referências bibliográficas

 

Bastos, L. A., & Ferreira, I. M. (2010). Composições fitofisionômicas do bioma cerrado: estudo sobre o subsistema de Vereda. Espaço em Revista12(1).

 

Haridasan, M. (1982). Aluminum accumulation by some Cerrado native species in Central Brazil. Plant and Soil 65: 265-273.

 

Klink, C. A., & Machado, R. B. (2005). A conservação do Cerrado brasileiro. Megadiversidade1(1), 147-155.

Marinho-Filho, J., Rodrigues, F. H., & Juarez, K. M. (2002). The Cerrado mammals: diversity, ecology, and natural history. The Cerrados of Brazil: Ecology and natural history of a neotropical savanna, 266-284.

 

Ribeiro, J. F., & Walter, B. M. T. (1998). Fitofisionomias do bioma Cerrado. Embrapa Cerrados-Capítulo em livro científico (ALICE).

 

Walter, B. M. T. (2006). Fitofisionomias do bioma Cerrado: síntese terminológica e relações florísticas. Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia-Tese/dissertação (ALICE).

2 Replies to “As Riquezas do Cerrado”

  1. Oiii, me desculpe porém fiquei com um pouco de duvida em um trecho do texto “O solo do Cerrado possui concentrações de alumínio elevadas decorrentes do acúmulo desta substância em suas folhas, arbustos e árvores nativas.” .. pra mim ficou meio estranho pois está dizendo que a concentração de alumínio do solo é devido ao acúmulos nas folhas, porém solo não tem folha… acho que ficou faltando alguma coisa ai… 😉

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